quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Segundo Fábio Brazil ¨Ninguém passou a gostar de Mozart por ter decorado a grafia correta de uma nota dó ou de um ré. Tenha dó e não ande a ré. Poemas são delicias musicais, melodias visuais, sinfonias verbais. A leitura e escuta de poemas faz mais pelo aprendizado da linguagem verbal do que todas as horas do ba-be-bi-bo-bu. Basta beber uma bica boa, bubu. O código verbal escrito foi uma linguagem gráfica que se desenvolveu dentro da linguagem sonora. A escrita musical também. Os fonemas são unidades mínimas do sistema sonoro de uma língua e são representados graficamente pelas letras. As notas são unidades mínimas do sistema musical e são representados graficamente na pauta. Unindo as notas, surge a música. Unindo os fonemas e as letras surgem as... mentiras. Foi exatamente esse raciocínio que levou à nossa deseducação verbal, levou à milhões de inescritores e desleitores.
As palavras. Era isso que as abecerizadoras e beabarizadoras gostariam que fosse escrito onde se escreveu mentiras. não porque não gostam de mentiras, mas porque não gostam de palavras. Melhor, preferem acreditar em mentiras a entender as palavras. Ou, ainda, porque gostam das mentiras que acreditam ser as palavras e não das palavras que gostam de desacreditar mentiras. O poema é um ser em palavras.Palavras são seres sociais em permanente estado de transformação. Palavras têm forma, som e sentido. Palavras são sociais porque para serem palavras precisam pertecer a uma língua, uma sociedade, um tempo e um espaço. Uma palavra, para ser para ser uma palavra, ela precisa de outras palavras. A forma de uma palavra é o resultado de diversas palavras, o seu som nasceu da dicção de muitas outras palavras e o seu sentido só é apreensível se apresentado por palavras. Ainda, para permanecer palavra, a palavraprecisa se ligar a outras e mais outras que lhe garantem a sobrevivência numa permanência mutante. A fala é o habitat selvagem das palavras, o poema seu Édem original. Beabarizzadoras não gostam de palavras. Não gostam de sua natureza viva e mutante, preferem-nas mortas, servidas em pedaços ou empalhadas. Abecerizadoras não gostam de como as crianças brincam, sentem e entendem as palavras, suas irmãs.Abecedarizadoras não lêem poemas para si, muito menos para crianças; não escrevem poemas nem incentivam que as crianças o façam. Elas não gostam de conversar com as crianças, não sentam en roda com elas, não contam histórias nem lêem poemas. O que elas gostam é de mutilar palavras, matar sua natureza social e guardá-las aos pedaços no formol ou em jaulas. Aula já! Jaula jáera .Abecerizadoras não jogam nem ensinam a jogar a linguagem verbal, não se divertem nem são divertidas, não se apaixonam nem são apaixonadas pelas palavras. Tomam a linguagem verbal algo tão enfadonho e motivo de tal incuriosidade que afastam definitivamente de si e dos seus alunos a deusa Fortuna. Um poema é uma espécie de mágica de cartas.Somente boa leitura faz o bom leitor. Não se aprende a jogar fora do jogo. Somente a leitura e escuta de muitos textos aprimora a percepção textual, qualifica a escolha de novos textos, sensibiliza o leitor/ouvinte para o prazer textual e, enfim substantiva e verbaliza os aguados adjetivos com que nos referimos aos textos. O bom poema é aquele que diz o que só poderia ser dito daquela forma e naquele poema¨

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